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Marcio Meirelles volta a comandar espetáculo no Vila Velha

Montagem ‘Drácula’ estreia nesta sexta (17) no palco principal do Teatro Vila Velha

Clarissa Pacheco – Jornal da Metrópole

O diretor teatral baiano Marcio Meirelles volta a comandar um espetáculo no Teatro Vila Velha. A montagem ‘Drácula’, baseada na obra homônima de Bram Stoker, estreia nesta sexta-feira (17) no palco principal do teatro e segue em cartaz até 26 de agosto e, depois, entre 14 a 23 de setembro, sempre às 20h.

foto: joão milet meirelles

foto: joão milet meirelles

JM – Quando começou a ser feito o trabalho de ‘Drácula’ e quando surgiu a ideia de trabalhar a história em teatro?

MM – O Supernova começou a trabalhar na montagem em março, os ensaios em maio. Mas a ideia de traduzir o romance para o palco, é de 1977, 35 anos portanto. Li o romance de Bram Stoker no verão de 76, quando morava no Rio. Fiquei muito impactado principalmente com a riqueza do livro que não era traduzida em nenhuma adaptação pro cinema ou quadrinhos… Daí me veio a vontade de vê-lo no palco. Logo depois voltei pra Salvador e outros artistas e eu criamos o Avelãz y Avestruz. Fizemos alguns espetáculos. Éramos um grupo, podíamos planejar, criar juntos, desenvolver uma metodologia de trabalho e uma poética. Enquanto estávamos montando FAUSTO, voltou a vontade de encenar o romance. Tinha Carlos Nascimento, que fazia Mefisto, na peça, e que na época achávamos ideal pro papel do vampiro. Mas ele não quis e foi bom. Explico: dali até agora, vivi muitas coisas aprendi que existem muitos teatros, muitas formas de se fazer discursos. Copolla fez a sua adaptação do romance pro cinema, incluindo a ideia absurda de que o vampiro é movido por uma paixão romântica, é um ser apaixonado. E não consigo encontrar pista para isso no romance. Herzog fez sua belíssima versão de NOSFERATU, onde a questão da solidão, do poder e da imortalidade são tratados poeticamente. Tive acesso à história em quadrinhos de Crepax, que condensa todo o roteiro de acontecimentos do livro, magistralmente…. o Avelãz y Acestruz acabou, trabalhei com outros grupos em outros processos e sistemas de criação e produção, teve o TCA, o Vila Velha, o Bando… passei pela gestão pública. Comecei a investigar o diálogo entre a cena e as tecnologias do audiovisual e da computação…. enfim: foi agora.

JM – Há um diferencial na apresentação do protagonista. Como vai ser trabalhado isso?

MM – Pois é por isso foi bom Cacá (Carlos Nascimento) não ter querido fazer à época. Agora percebo que a presença de Drácula, no livro, é maior do que poderia ser representada por um ator. Ele é onipresente. De 27 capítulos que tem o romance, aparece somente nos quatro iniciais. E esta parte da narrativa é usada em todos os filmes sobre o mito. Depois, passamos dez outros capítulos sem ver o seu nome sequer ser mencionado e sua presença está na atmosfera, nas tempestades, em animais, em névoa… depois, até o fim, ele aparece mais 3 vezes: uma, é visto andando na rua (ao meio dia), noutra é flagrado no quarto dos seus antagonistas, dando o sangue de seu peito à Mina, a última é quando seu caixão é aberto e, sem uma palavra, é morto. Portanto, Drácula é tudo, é toda a narrativa, é um monstro construído ardilosamente por vários testemunhos registrados em cartas, diários, notícias de jornal e outros documentos. Não é alguém é algo que tememos em nós mesmos, é algo que o ocidente constrói e trás do oriente para autorizar expedições, invasões, destruição e colonização de povos e culturas…

JM – Como é, para você, levar ao palco do teatro a história de um “mito”?

MM – Gosto desses grandes mitos da humanidade, sempre achei que o teatro vive deles e se perde quando esquece isto. Fausto, Dom Quixote, Baal, Drácula, Medéa, etc são mitos que nos explicam que tratam das grandes questões sem resposta que encaramos durante toda nossa existência… Com eles o Teatro trata do poder, da morte, da saúde da cidade, da polis, cuida de seu papel político.

JM – Há um tempo a peça vem sendo divulgada na internet, inclusive o processo de produção. É uma inovação? O uso da tecnologia faz parte da montagem?

MM – Alguns outros grupos e artistas têm feito isso também. O teatro do século XXI tem que dialogar com todas as novas formas de comunicação, tem que redescobrir seu papel no mundo contemporâneo. Ha que construir novas dramaturgias (estruturas narrativas da cena) e novos atores capazes de interagir com bytes. Lidar com seu corpo físico e esse mesmo corpo transformado em bytes e espalhado num universo virtual. Além do quê, gosto de tornar públicos os processos. Gosto de colaboração. A cultura digital tem propiciado isso. Temos a possibilidade de tornar um processo criativo aberto a todos. Sempre meus ensaios são meio assim, sempre tem gente assistindo, estudantes que acompanham as montagens, outros artistas… é bom. Quando o espetáculo estréia ele é o resultado de uma grande discussão sobre um determinado tema ou momento do mundo, do homem ou da cidade. Ganha mais legitimidade.

JM – Como foi esse processo de produção?

MM – Conversei casualmente com Ciro Sales e Will Brandão sobre minha vontade de fazer DRÁCULA. Tem umas 10 peças que gostaria de fazer antes de morrer. Já tenho 58 anos e é tempo de ir fechando as contas com o mundo. Daí eles e Luisa Proserpio quiseram tornar o projeto uma realização do Supernova em residência no Teatro Vila Velha. O Teatro tem se equipado para isso, pra responder a essas demandas de um teatro digital. E estamos fazendo.

É um elenco jovem, com pessoas com quem nunca tinha trabalhado, mas que já tinham feito oficinas comigo e já sabiam o que ando procurando com o teatro, minhas angustias com o tempo e com o mundo, minhas propostas estéticas e políticas e toparam encarar também o mito Drácula. É uma forma nova de fazer teatro. São muito dinâmicos, um misto de empresários e artistas. Uma nova geração mesmo. Tá sendo também interessante acompanhar através deles os caminhos da produção teatral na Bahia.

publicado em 17/08/2012 no blog:

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Publicado em 17/08/2012 | nenhum comentário

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