DE PORTAS ABERTAS
texto para o programa de 7 CONTRA TEBAS – estreia 08/01/2016 . teatro vila velha
visitar as origens é necessário
o teatro ocidental tem muitas origens
a origem mítica é a tragédia grega
esse teatro pre dramático gerou padrões e referencias canônicas
narrativa épica compartilhada entre coro e personagens
narrativa musical c regras matemáticas
estrutura estabelecida e preenchida por conteúdos variáveis
enredo tema e forma conhecidos
o engenho do dramaturgo era recontar
a um público o q era necessário ser debatido
pela cidade
as vitórias os perigos as questões os valores através dos mitos
uma vez por ano eram apresentadas num festival
para atenienses e povos vencidos que iam a atenas nesse período
pagar tributos e testemunhar a superioridade estética dos vencedores
como seriam de fato esses monumentos então?
como escolas de samba?
esperadas e preparadas durante o ano para uma apresentação
onde competiam entre si por uma vitória q traria glória ao autor
e prestigio ao patrocinador q financiava o coro
os cantos e danças q contavam histórias emitiam conceitos
atravessavam consciências
as tragédias estão no mundo como a esfinge
decifra-me ou devoro-te
todos nós pessoas de teatro desejamos este momento do confronto
em q vamos olhar de frente uma delas e a enfrentar
esperei e me preparei em 99 trabalhos de teatro para encarar uma
temos muitas informações sobre como e pq eram feitas as tragédias
mas uma encenação n é um trabalho arqueológico
é preciso entender o q levava 10 mil espectadores a ver/participar
daqueles acontecimentos
2 mil e 500 anos atrás
somos outros mas há algo de fundamental no sentido de fundamento mesmo
como a base de um edifício sólido
nestas peças
e o q é isso?
a universidade LIVRE de teatro vila velha
faz em seu terceiro ano/arco essa investigação
já passamos pelo exercício da dramaturgia do verso da rima da métrica do ritmo do espaço transfigurado do movimento das muitas formas de movimento da prática coral da gestão da técnica já carregamos praticáveis montamos cenários luz já divulgamos cuidamos de figurino produzimos repassamos gerimos recursos brigamos entre nós e c o mundo vimos muitos passar e desistir e tomar outros rumos e estamos preparados para enfrentar a esfinge devora-me ou decifro-te
e neste OU n há contradição é uma provocação complementar
é preciso devorar e ser devorado para se decifrar
findamos 16 de um universo de quase 100 pessoas q se encontraram
praticamente todos os dias durante 3 anos de 2a a sábado das 9h às 13h vestidos de branco p q nossas roupas fossem o exterior do q são as atrizes/ atores = telas em branco para receber todas as cores todas as formas dos discursos q resolvermos fazer
e para q a sujeira anexada às nossas roupas no fim do dia fosse testemunha do quanto trabalhamos
durante 3 anos nos encontramos c mta gente vivos e mortos
este ano/arco foi o kayros dos gregos
encontramos ésquilo sófocles eurípedes
alguns preferiram o esquematismo de ésquilo outros a proximidade quase dramática de eurípedes ou a um pouco menos de sófocles
mas ésquilo gritava
era como esses monumentos arcaicos ancestrais
feitos de poucas e poderosas linhas q sustentam um pulso terrível
quase fulminante
deveria ser ele o início de nossa trajetória pela hélade
como todos os clássicos existe um q deve ser apresentado agora
e mais encontros
marcus mota nos apresenta 7 CONTRA TEBAS
– uma das sete tragédias de ésquilo q sobreviveram completas –
em sua tradução poli rítmica
o debate entre o governante de uma cidade sitiada e as mulheres cidadãs contaminadas pelas informações e pelo medo e geradoras elas próprias de informações e mais medo
debate com interferências de mensageiro/espião q vem c notícias do mundo fora dos muros e faz cidade e governante se moverem e faz a história andar
salva-se a cidade ou salvo-me eu?
decifra-me ou devoro-te
ésquilo através do governante de tebas nos mostra
q qdo se está neste lugar há um preço
e ainda q a cidade peça q ele se salve
o governante opta pelo próprio sacrifício e a cidade é salva
mas esse sacrifício é justo pq aniquila o inimigo
é a coroação de decisões fundamentais q levam a cidade à vitória e à paz
era esta a peça q deveríamos fazer
ela nos fala da grécia contemporânea e seu papel no mundo ocidental
ela nos fala do brasil e seus inimigos externos e internos
ela nos fala de salvador – cidade sitiada sem um eteocles q a salve
ela nos fala de nós
mas como entrarmos nesse universo mítico de apolos e zeus e erínias e tifeus e preceitos ancestrais esquecidos e formas narrativas arcaicas
feita de exposições e cantos e diálogos construídos de falas e cantos
novos encontros
pedro filho entendeu pq já tb nadava neste mar o conceito
tínhamos q colocar os nossos ritmos naqueles versos
e a riqueza musical de nossa cultura herdada dos ancestrais africanos
era a chave
o coro quando entra faz um xirê invocando seus deuses
invocamos os nossos e pedimos tb proteção
daí visitar os modos gregos o necessário
para q nossos ancestrais helênicos tb fossem invocados
e ficou evidente q nossos ancestrais africanos eram tb ancestrais dos gregos
tá tudo ali no pulsar dos atabaques e no canto das mulheres
e o rock.n.roll brotado da mesma fonte surge como um raio
como um clarão
cristina castro orquestrou os movimentos
esquecemos os vasos gregos e sua quase notação coreográfica
e recorremos a rejane maia com as danças sagradas afro baianas
e contivemos os gestos p explodir o espírito
jônatas raine levantou proposições das atrizes/atores
e juntos ele e cristina compuseram as estrofes e antístrofes físicas
os deslocamentos o pulso q mantém o olho ligado ao som
q música para os gregos era som corpo movimento
p nós tb
e ainda 7 CONTRA TEBAS nos fala do teatro
e nos fala do teatro vila velha
linguagem e espaço q difunde a linguagem
cidades sitiadas por forças q a ameaçam
e de bravos guerreiros e bravas mulheres tb guerreiras
e bravos artistas e técnicos e gestores e produtores e colaboradores e brava gente q canta e dança e atua
e vai encontrar maneiras de n fechar suas portas
márcio meirelles
salvador . 05.01.2016